Envolto numa ligeira sombra mágica, Ayalal conteve a respiração por segundos, enquanto absorvia todo aquele novo mundo. Olhou para Lysa, depois olhou para o horizonte, e voltou a olhar para Lysa, sem palavras.
A jovem riu-se um pouco.
– É uma vista bonita, não é? O resto do mundo – notou.
– É – murmurou Ayalal, afastando-se três passos pelo carreiro pedregoso que descia a pique.
Os olhos de Lysa arregalaram-se, alarmada, e esticou a mão para o agarrar, porém Yudarh atravessou o bastão diante dela, impedindo-a.
Fascinado, o pequeno comtemplou a distância, o azul do céu, as suas nuvens de forma peculiar e, de olhos semicerrados, o próprio Sol. Voltou a escutar o pio agudo do falcão e desta vez viu-o, passando ao largo num voo lento. O bater daquelas asas transmitiam-lhe uma liberdade pura. De seguida, deu mais alguns passos pelo trilho, reparando noutra coisa. Derrapou uma vez, mas a curiosidade deu-lhe uma segurança extra, ajudando-o a equilibrar-se. Acocorou-se junto a uma pedra e ficou muito quieto a observar uma solitária flor. O vento sacudia-a, porém a resiliência da planta ultrapassava a óbvia fragilidade. Esticou um dedo e tocou, suavemente, nas pétalas vermelhas. Era, sem dúvida, o ser mais belo que alguma vez vira.
– É uma papoila. Podes levá-la contigo – disse Lysa que, com cuidado, fora espreitar o que lhe chamara a atenção.
– Não. – Ayalal abanou a cabeça. – Esta é a casa dela, vive aqui. Não posso tirá-la. Estaria a ser mau para ela.
Lysa não insistiu, gostando, na verdade, daquela demonstração de preocupação.
A poucos metros deles, Yudarh acabou por se sentar à entrada do túnel, lançando-lhes uma mirada serena, antes de perder os pensamentos no vasto horizonte.
As horas passaram. O Sol subiu mais no céu, até atingir o zénite, enquanto Ayalal fazia várias perguntas sobre o que conseguiam ver dali, o que é que vivia nas florestas… e quando é que poderiam ir ver o mar de perto.
Lysa abriu a boca, hesitando na última resposta.
– Isso… bem… quando fores mais velho.
Ay insuflou as bochechas.
– Amanhã já sou mais velho – notou.
– Ah, sou eu que decido quão mais velho tens de ser – riu-se Lysa. – E agora temos de voltar para casa.
– Já…?
– Já. O Mestre Yudarh usou esse feitiço duas vezes em ti, não devemos abusar da boa vontade dos outros. Voltaremos noutro dia – disse-lhe.
O pequeno fez beicinho, porém acabou por concordar com um aceno. Pouco depois faziam o caminho de regresso pelo túnel, deixando para trás a luz do dia.
Quando chegaram à encruzilhada, Yudarh fez sinal com o bastão para o caminho que os levaria à cidade.
– Podem regressar ao orfanato. – O tom era indiferente e seco, nada a que não estivessem habituados.
Lysa sorriu e fez uma ligeira vénia.
– Agradecemos por tudo, Mestre. Não é, Ay?
Ayalal mirou Yudarh, claramente hesitante, antes de se achegar, não tão subtilmente quanto gostaria, e lhe oferecer um súbito abraço ao nível das pernas.
– Obrigado, Mestre Yu – murmurou, antes de o largar tão depressa quanto o agarrara, indo, muito envergonhado, dar a mão a Lysa.
O tiefling não lhes respondeu. Ficou parado, vendo-os afastarem-se por um momento, antes de ele mesmo voltar aos seus afazeres. Ayalal ainda olhou para trás a tempo de o ver desaparecer pelo lado da encruzilhada que levava à escuridão.
***
Sem comentários:
Enviar um comentário