Ayalal acabou por adormecer no colo de Lysa. Com cuidado, a jovem afagou-lhe o cabelo escuro. Tinha pena de simplesmente o levar para o quarto onde as restantes crianças descansavam. As mesmas crianças que o atormentavam. Hesitou, acabando por pegar nele ao colo e seguir para o aposento das raparigas mais velhas. Eram quatro, contando com ela, e todas haviam crescido no orfanato, sob a tutela da Directora Drane.
Deitou-o na sua cama, junto a si, e aconchegou-o. Ay encolheu-se, como fazia sempre, parecendo ainda mais pequeno.
– Bons sonhos – sussurrou-lhe, antes de também ela fechar as pálpebras para dormir.
*
Ay correu à frente, enquanto Lysa acabava de subir a escadaria que desembocava no início do túnel. O rapaz tinha uma estranha energia, apesar da sua palidez, principalmente quando estava animado. Seguiu o percurso entrecortado por luz e sombras, e acabou por apanhá-lo parado no meio da encruzilhada, de cenho franzido, observando o caminho que dava para a escuridão.
– Pareceu-me ver algo a mexer – disse, quando Lysa parou ao seu lado.
– Al… algo? – A voz da jovem tremeu. – Não há nada aí, Ay…
– Tenho a certeza que vi qualquer coisa – insistiu, dando um passo para a escuridão.
– Não! – Lysa agarrou-o pelos ombros e fê-lo voltar-se um pouco, empurrando-o de seguida para o lado do qual ficava a casa do mestre Yudarh. – Foi só impressão tua.
Ayalal insuflou as bochechas porém não insistiu, olhando por cima do ombro para o negrume que deixavam para trás. Não era proibido ir por ali, mas ninguém se atrevia a fazê-lo. Nem luzes se haviam dado ao trabalho de pôr. Ou teriam e alguém as apagara? A curiosidade remoía-o.
Quando chegaram ao fundo do túnel e bateram à porta de casa de Yudarh, este tardou a recebê-los. Voltaram a bater. Insistir era a chave para serem recebidos. Por fim a porta abriu-se.
– Já vos disse…
– Viemos fazer-lhe uma visita, mestre – cortou Lysa, não lhe permitindo terminar a frase do costume. Ambos achavam que Yudarh estava demasiado sozinho ali. Tanto que Ay, preocupado, perguntava-lhe, de vez em quando, se ele não poderia viver também no orfanato.
Ayalal acenou, mirando-o.
– E trouxemos uma coisa – disse, levando uma mão ao bolso do casaco de cotovelos recosidos que outrora já fora vestido por outras crianças. Retirou um embrulho de tecido que Lysa reconheceu e estendeu-o ao tiefling.
Yudarh franziu o sobrolho, pegando na oferta, e puxou o cordel com uma garra, revelando o bolinho que se escondia no interior. Arqueou as sobrancelhas, por um instante, lançando uma mirada à criança, antes de guardar o inesperado presente.
– Faz hoje quatro anos que comecei a tomar conta do Ayalal – comentou Lysa, pousando uma mão no topo da cabeça da criança e fazendo-lhe uma festa. – Ele decidiu repartir o seu presente entre nós.
– Estou a ver… – hesitou, passando uma mão pelo queixo, pensativo. – Ia agora sair. Querem vir?
Lysa piscou os olhos.
– Para onde?
– Para a superfície. – Um dos cantos dos lábios de Yudarh ergueu-se de modo ténue, ao ver o olhar de Ayalal brilhar de entusiasmo.
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